“O que me interessa no amor, não é apenas o que
ele me dá, mas principalmente, o que ele tira de mim: a carência, a ilusão de
autossuficiência, a solidão maciça, a boemia para suprir vazios. Ele me tira
essa disponibilidade eterna para qualquer um, para qualquer coisa, a qualquer
hora. Ele apazigua o meu peito com uma lista breve de prós e contras e me dá
escolhas. Eu me percebo transformada pelo que o amor tirou de mim por precisar
de espaço amplo e bem cuidado para que ele se instale. O amor tira de mim a
armadura, pois não consigo controlar a vulnerabilidade que vem com ele; tira
também a intransigência. O amor me ensina a negociar os prazos, a superar
etapas, a confiar nos fatos. O amor tira de mim a vontade de desistir com
facilidade, de ir embora antes de sentir vontade, de abandonar sem saber por
quê. E é por isso que o amor me assombra tanto quanto delicia. Porque não posso
ignorar a delícia que sinto quando estou sozinha. E também não posso fingir que
quero estar sozinha quando o meu ser transborda vontade de companhia. O amor me
tira coisas que eu não gosto, coisas que eu talvez gostasse, mas me dá em dobro
o que nunca tive: um namoramento por ele mesmo. O amor me tira aquilo que não
serve mais e que me compunha antes. O amor tirou de mim tudo que era falta.”
- Marla de Queiroz
- Marla de Queiroz
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